terça-feira, 29 de dezembro de 2009

um dia vou ver o mundo lá de cima


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"Tenho em mim todos os sonhos do mundo"
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Fernando Pessoa
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Era simplesmente um quarto simples. Não havia a decoração a rigor como mandava a época, nem sequer era o dia marcado no calendário e desejado por tantas crianças. Visto de fora, era só mais um dia, só mais uma noite.
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A barriga há muito que saltitava de ansiedade, aquele friozinho que inquieta e desnorteia até os mais sérios. Tentava esconder o entusiasmo, mas a agitação saltava-lhe por uns olhos vivos e denunciantes. Ele sabia que aquele momento tinha um sabor especial, um misto de meninice e inocência.
Abriu a porta e a temperatura acolhedora afagou-lhe de imediato a alma. Não era preciso muito mais do que aquela simplicidade, aquele pequeno gesto, preparado a rigor para lhe enternecer o espírito. Era simplesmente um quarto simples onde as paredes guardam segredos, confissões, desejos, sonhos e momentos do que parece já uma vida inteira.
Sentou-se na cama, de pernas cruzadas como as crianças, e esperou impaciente que partilhassem o seu Natal. Primeiro foi a vez dela, presentes embrulhados de amor e laços de ternura. A cada rasgo do papel inquietava-se. Impunha-se um desassossego, será que ia surpreendê-lo? O sorriso e os olhos brilhantes, o abraço instantâneo e o obrigado rasgado denunciavam a sua felicidade. Sabia que tinha acertado em cheio!
Depois foi ela a descobrir por entre bem-querer e afeição o que lhe reservava aquele amor. Devagar tentava não rasgar o que com tanto carinho tinha sido embrulhado, mas o desejo de encontrar o que estava por baixo foi mais forte. A cada presente, uma surpresa e seguiam-se sorrisos e uma alegria contagiante. Soube surpreendâ-la em cada pormenor!
Era simplesmente um quarto simples onde o natal se ofereceu em afectos e sentimentos trazidos do coração! Porque é na simplicidade que vivem as coisas mais bonitas!
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Um dia vou ver o mundo lá de cima...
Obrigada!!!
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terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Natal quentinho


- Sabe o que me custa mais? Não é ter perdido as forças nem estar doente... (fechou os olhos, baixou a cabeça e respondeu-me) ... é estar uma papa e não ter ânimo. Não ter vontade de nada... Eu que era uma pessoa cheia de objectivos e coisas para fazer.


Confesso que não sabia como responder-lhe nos meus poucos 20 anos. Estava ali uma Srª adorável, 103 anos de vida que me tinham cativado em poucos momentos e uma vontade de viver que se tinha escondido não sabia onde. Deixei-me ficar calada, sabia que tinha mais para me dizer (Ali aprendi, aos poucos, a gostar do silêncio. Aprendi que o silêncio é o melhor e o mais sincero dos diálogos.)... Depois olhou-me nos olhos e serenamente disse-me:


- Não tenho vida e tenho medo de não voltar a tê-la...


Sim, engoli em seco. Notei naquela Srª que estava ciente de que isso poderia vir a acontecer. Percebi que tem tentado preparar-se para uma morte (Outra coisa que aprendi a tratar por tu e sem medos). Não falo da morte física, mas talvez pior...o luto da vontade de viver. Sabia que tinha de fazer qualquer coisa mas também estava ciente de que podia pôr o pé em falso e qulaquer palavra fora do contexto poderia acabar com uma relação que estava a iniciar-se. Nestas alturas a cabeça trabalha-me a mil, tento procurar todos os ensinamentos que os bons profissionais me deram, mas é precisamente nestes momentos que o coração age sempre primeiro... e dei-lhe a mão. A cabeça dela levantou-se, sorriu e agradeceu-me.


- Sabe? Amanhã talvez tenha para si um miminho que a vai alegrar. Vamos montar a árvore de Natal no serviço e gostava muito que fosse comigo pôr lá uma bolinha... (não precisei de dizer mais nada, à minha frente uns olhos pequeninos iluminaram-se e cresceu um sorriso verdadeiro)


- Vão fazer uma árvore de Natal? Que bom! (e apertou-me as mãos com força, enquanto se enchia de alegria). É claro que vou. Gosto do Natal... da luz... daquele quentinho! (Sorri-lhe!, não podia responder-lhe de maneira mais sincera)


- Fico muito feliz por vê-la assim!


- E vem buscar-me a que horas? Eu quero vestir-me bem. Vamos fazer uma árvore muito bonita e aquecer o ambiente!

(Não sei por andava o ânimo desta princesa, mas eu enfeitaria as árvores todas só para lhe ver novamente aquela felicidade no rosto)


(...)


E no dia seguinte lá estava a minha menina, toda bonita de sorriso rasgado e olhos de criança sôfrega de vida. Pôs bolinhas, anjinhos e um cartão de desejos na árvore e voltou feliz para o seu quarto.

Não tinhamos muito com que levar o Natal àquele serviço, mas tinhamos vontade, empenho, convívio e sorrisos, muitos sorrisos que ali são o bem mais precioso e o melhor remédio.
E é isto que quero levar a todos os meus meninos e meninas crescidos, sorrisos e olhos brilhantes. Mas neste mês, mais do que em qualquer altura, quero aquecer aqueles corações e levar-lhes pequenos presentes embrulhados em amor.
Assim, peço a todos os que me leiam que partilhem comigo ideias e projectos que me permitam levar àquele serviço um Natal quentinho.
Neste momento tenho uma guitarra à espera de uma voz bonita e cantante ou de uma veia de poeta que os encante com palavras bonitas.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

apeteceu-me dizer-te que...


Apeteceu-me dizer que gosto de ti e muito!
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...sabias?
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domingo, 6 de dezembro de 2009

Sinatra


Lá fora o frio cobre a cidade. Aqui dentro sou só eu e a lembrança que ficou de ti. A caneca com chocolate quente aquece-me as mãos e a manta pelas pernas traz-me o conforto desejado nestes dias de Inverno. Lá para dentro o Sinatra canta-me “wake up to reality...”, eu encolho-lhe os ombros e finjo que não o oiço. Gostava de saber porque tiveste de partir assim. Tão de repente sem termos tempo de nos despedirmos “até um dia”. Saíste apressada, a franja a cobrir-te os olhos pequenos de sono e a boca pingada de leite fresco, aquele que bebias todas as manhãs com a torrada mergulhada em manteiga. “Derretida porque eu não gosto dos bocados inteiros na boca, gosto só do molhinho”. Sabia-te cada mania e cada gesto de cor. Podia até adivinhar quando pestanejavas ou soltavas um suspiro de cansaço. Com o passar dos anos aprendemos a conhecer-nos em cada pormenor. E aquele era só mais um dia igual a todos os outros que viviamos descansadamente. “Não precisamos de ter pressa do amanhã, fomos feitos um para o outro para toda a vida, não é meu amor?”, esfregavas o teu nariz no meu e rasgavas um sorriso inigualável. Gostava de ver as tuas rugas de expressão no nariz franzido e aquelas pregas desenhadas a preceito ao canto da boca.
Hoje era dia de te acordar com um bolo de setenta e duas primaveras. O bolo está ali, eu e o Sinatra cantámos-te os parabéns mas as velas ainda ardem. Falta o teu sopro. Faltas tu!
Os dias foram passando mas não fui capaz de aceitar a tua ausência. Continua tudo na mesma. O teu lugar à mesa, a tua escova de dentes, a tua almofada na cama, a marca do teu lugar no sofá. Dizem-me que isto não é vida para ninguém e que tenho de seguir em frente. Que não é vida isso sei eu, deixou de o ser há quarenta e seis anos. “O tempo cura tudo”, que se desengane quem nisto acredita. O tempo traz mudança mas só ensina a ver as coisas de outra maneira. O nosso jardim perdeu as flores mais bonitas, o chão da casa começou a ranger, as portas dos móveis da cozinha empenaram, a torneira da casa de banho está sempre a pingar e os cortinados estão velhos e gastos. O meu corpo curvou-se, os passos tornaram-se mais pequenos e baralhados, o cabelo perdeu-se por aí e os olhos foram-se infelicitando. Mas o amor, esse, é o mesmo. Junta-lhe a saudade, a amargura e a tristeza de um coração que bate sozinho. Mas o amor é mesmo!
Fazes-me falta e tu sabes mas como diz o Sinatra “tenho-te debaixo da minha pele”!